Azulejo e arquitetura
A especificidade do Azulejo como modalidade artística maior do Património português ao longo dos séculos da Idade Moderna e Contemporânea, afirmou-se (e continua a afirmar-se) com especial originalidade, através da sua articulação cenográfica com as formas e espaços da arquitetura. As fachadas revestidas de azulejaria, tanto de padronagem como de figuração, assim como os espaços intestinos das casas residenciais, as escadarias urbanas, as câmaras palatinas, as capelas e oratórios domésticos, os pátios, os bancos de jardim, e outros lugares de vivência social, testemunham as vitalidades de um diálogo inesgotável entre linhas construtivas e formas cerâmicas, sem paralelo noutros contextos culturais fora das fronteiras do chamado “mundo português”. Essa sublime expressão dialogal, que tira partido dos efeitos cromáticos e das variáveis matizes lumínicas, afeiçoa este gosto português pelas linguagens sui generis, que são em absoluto originais e ousadas, no modo como, através dela, atenua as fronteiras tradicionais entre a arte erudita e as artes vernáculas, transformando-as em jogos de simbiose especialmente encantadores.
Trata-se de um património único pela sua diversidade e quantidade, posto que ameaçado, muitas vezes, pela insensibilidade das tutelas e das intervenções construtivas, o que justifica um esforço acrescido de estudo sistemático, de inventariação exaustiva, de cuidados preventivos e de salvaguarda – tal como, há muito tempo já, era defendido por especialistas como Santos Simões, Mário Barata, Dora Alcântara, Irisalva Moita, José Meco, e vários outros estudiosos das fachadas. Os recentes estudos de Ana Almeida neste campo, explorando a intimidade das relações entre a arquitetura e o azulejo ao nível do projeto, abre um caminho significativo para se definirem melhor os processos construtivos e decorativos e se perceberem estas opções estéticas, que falam em português. Estas arquiteturas com azulejo expressam numa linguagem de múltiplas originalidades, que se repete em incontáveis variantes pelos espaços do “mundo português”. O olhar sobre este património plural conjuga-se com a abordagem de Ana Mehnert Pascoal, no seu livro «A cidade do saber», onde estuda o património artístico integrado nos edifícios projetados por Porfírio Pardal Monteiro para a Cidade Universitária de Lisboa entre 1934 e 1961, com ênfase aos revestimentos de azulejo por artistas contemporâneos como Hein Semke, Fred Kradolfer, Querubim Lapa ou Jorge Barradas.
Vítor Serrão | diretor do ARTIS – Instituto de História da Arte (FLUL) e da RTEACJMSS |
Convidados: Ana Pascoal [Museu Nacional de História Natural e da Ciência – UL] Ana Almeida [Rede Temática em Estudos de Azulejaria e Cerâmica João Miguel dos Santos Simões – ARTIS-IHA/FLUL]
Moderador: Marta Lourenço [Museu Nacional de História Natural e da Ciência – UL]